terça-feira, 8 de dezembro de 2009

«Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!» José Régio, Cântico Negro



Olho um horizonte imenso! Uma lua vermelha projecta-se nos meus passos. Os meus olhos têm a cor dessa lua. É sangue, é dor, é raiva em mim.

Dizem-me «vem por aqui!» E dizem-me «Falo honestamente o que penso!»
Repetem, estendendo-me a falsa segurança de um abraço «estou aqui… anda… vem por aqui!»
E eu olho… nos meus olhos há a luz vermelha desta lua! Nos meus olhos, há ironia, cansaço, incredulidade, espanto! Ergo a minha vontade como bandeira ao vento e digo não vou por aí!
Não quero as palavras ocas de um não saber sentir. Não quero regras de não saber sonhar. Recuso caminhos feitos e liberdades vazias. Digo não a essa honestidade de ferir. Não quero palavras que matam como punhais – palavras tão sanguinárias como esta lua!

Eu tenho a minha loucura no sentir. Rasgo a vida como rasguei «o ventre de minha mãe». Amo os sorrisos e as rosas. Amo o vento que me devolve o sentir. Guardo na minha carne este saber o prazer. Sorrio aos caminhos verdes da luxúria, recuso os caminhos pardos do não saber sentir.

Não me digam «Vem por aqui!» Não me digam «pelo amor de Deus!» Não me falem em boas intenções! Os deuses estão nos céus demasiado ocupados com as suas quezílias. O inferno está cheio de boas intenções! Não me falem em coragem – quem ma dará?! A minha coragem está no sorriso com que me levanto todos os dias!

Não queiram que seja isto ou aquilo! Querem-me assim?! Querem-me o contrário de assim?! Tenham paciência! Eu sou, tu és! E tenho direito a ser! E sou o meu destino, sou a minha loucura, sou eu nas minhas dores, sou eu nos meus prazeres, nas escolhas que faço em cada momento. Sou o pecado, os meus pecados! E nunca pedirei perdão de gozar esse pecado que é a minha entrega. Sou filha de deus e do diabo, escolho os meus caminhos, sigo a minha loucura.

A lua vermelha é agora a luz que me ilumina. E, suavemente, as lágrimas deslizam no meu rosto. Tenho na mão uma cesta vazia. Por trás de mim há vozes. São as vozes de um aprendemos! São vozes de um «não vou por aí»! Uma a uma, as vozes chegam-me íntimas num olhar, num sorriso e em flores que vão enchendo o meu cesto. As palavras de um cântico negro são brancas na pureza do sentir. Todas diferentes, as flores têm três anos de comunhão, de lágrimas, de dor, de alegria, de partilha de sorrisos, de aconteceres, de um crescer sempre, têm o querer agarrar a vida no devir.

No meu rosto, as lágrimas brilham de felicidade sob a luz intensa do meu desnudar ali. E as minhas palavras nascem sob esta luz vermelha. Talvez eu… talvez tu e tu… façamos uma mudança no mundo…Talvez eu… talvez tu… encontremos a chave das estrelas e, quando olharmos o céu, só precisaremos de ouvir a voz do coração. Talvez eu… talvez tu… sejamos chama que ilumina. Talvez eu… talvez tu… sejamos a diferença no mundo a construir.

Levanto o meu cesto como um facho. O meu rosto, os meus olhos, o meu corpo enfrentam o vendaval que se levanta noutros olhares. A minha voz afirma a certeza «sei que não vou por aí!»
E sou feliz!

1 comentário:

  1. Senti a força do teu "cesto" levantado com determinação.. o caminho e a chave da mestria das estrelas que te conduzem... e a força interior do teu sorriso esboçado como o Sol...

    Adorei...
    Beijos com carinho

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